LARANJA 10 X 0 PALMATÓRIA
Izaias Resplandes*
Dezembro de 2011. É fim de mais um ano letivo. Professores e alunos se preparam para entrar no gozo de suas merecidas férias. Ao término dessa jornada, como professor de Matemática na rede pública estadual, eu não me sinto plenamente satisfeito com os resultados obtidos neste ano. Gostaria de ter sido um instrumento mais útil e de ter proporcionado uma aprendizagem mais vigorosa para os meus alunos.
A cada ano que passa, eu sinto que os alunos estão perdendo a motivação para os estudos. Uma grande parte está apenas à procura de um “Diploma”. Uma minoria tem se interessado pelo efetivo conhecimento científico que a escola proporciona. No caso da Matemática, em particular, as dificuldades têm aumentado bastante. Quando os alunos usam instrumentos de cálculo e computadores para realizar as operações matemáticas eles são nota DEZ. Mas aí quem faz as contas são os computadores e não os alunos. Vale dizer que hoje existem dezenas de programas que fazem tudo o que os alunos precisam e que vai desde as operações fundamentais de adição, subtração, multiplicação, divisão, radiciação e potenciação até os mais avançados cálculos. Mas, quando o negócio é trabalhar sem esses instrumentos, aí os resultados vão a ZERO, porque eles não sabem e não querem saber como se faz as contas “na ponta do lápis” e dizem que se “há computador e calculadora” para fazer, porque eles precisam aprender isso? E aí se fecham e não aprendem. Mas, quando fazem as provas do ENEM, de vestibulares, de concursos públicos e testes seletivos e não conseguem fazer as continhas, aí jogam a culpa em seus professores que “não lhes ensinaram isso”. Esse é o grande dilema proporcionado pela eletrônica avançada de nossos dias.
Antigamente, para que se aprendesse a tabuada, o aluno era pressionado pela terrível palmatória. Com medo de tomar os bolos daquele instrumento (pancadas nas mãos), o aluno estudava, estudava até decorar todas as casas da tabuada. Isso era muito triste e eu passei por esse tempo.
Relendo o livro “Aritmética da Emília”, encontrei uma pequena narrativa onde Monteiro Lobato nos ensina através da Tia Anastácia, que “laranja” funciona melhor do que palmatória.
O negócio foi o seguinte:
O Senhor Visconde de Sabugosa estava fazendo uma apresentação/show sobre as “reinações” da Aritmética. E, em determinado momento disse que não seria possível continuar com o espetáculo se a platéia não soubesse a tabuada na ponta da língua. Então, como era tempo das laranjas, a Emília sugeriu que se escrevesse as casas da tabuada nas cascas das laranjeiras e que, se alguém desejasse chupar uma laranja daquele pé, deveria recitar de cor a casa da tabuada ali escrita. E a turma do sítio aderiu à idéia e, dessa forma, aprendeu mesmo a difícil tabuada.
Assim registra Lobato:
Ficaram desse modo tão afiados que Tia Nastácia não parava de abrir a boca.
— Parece incrível — dizia ela — que laranja dê "mió" resultado que palmatória — e dá. Com palmatória, no tempo antigo, as crianças padeciam e custavam a aprender. Agora, com as laranjas, esses diabinhos aprendem as matemáticas brincando e até engordam. O mundo está perdido, credo. . .
O que ocorre aqui é a velha questão da recompensa. O aluno é estimulado a aprender por causa da recompensa. Nesse caso, uma recompensa positiva; naquele caso, um castigo, uma recompensa negativa.
As recompensas positivas também são usadas pelos treinadores de animais. É costume vermos em filmes esses treinadores dando torrões de açúcar para recompensar o animal pela resposta desejada. Também vemos professores dando balas e bombons para seus alunos com o mesmo objetivo.
Certamente o estímulo doce é melhor do que a dolorosa palmatória, mas há algo que não mudou, ainda que não haja doces como prêmios. “Aquele que não aprende por amor, aprenderá pela dor”. Em algum momento da vida, o conhecimento fará falta para o aluno. Por causa disso ele poderá perder uma excelente oportunidade. Quantos de nós não temos lamentado o fato de não termos estudado o suficiente para ser aprovado nesse ou naquele concurso que nos traria um prêmio muito maior do que aquele breve esforço para a aprendizagem!
O sacrifício da aprendizagem é temporário; os benefícios proporcionados pelo saber são permanentes. Laranja ou palmatória... Não importa o que seja. Todos nós precisamos de estímulos, mas o melhor desses é a consciência de que, se não nos esforçarmos no hoje para aprender, o nosso futuro amanhã poderá ser ainda mais sofrível. E aí não adiantará buscar outros culpados. Somente quem é sujeito de sua própria aprendizagem é que pode ser responsabilizado por não ter aprendido o que precisava aprender.
A sorte é dos que se sacrificam para aprender e que aprendem, mesmo à custa do sacrifício de boas horas de lazer e entretenimento.
Boas férias a todos. Um bom final de ano e um feliz ano novo. E que 2012 seja o ano da grande e significativa aprendizagem para todos os homens e não apenas das máquinas e dos poucos homens que as inventaram. E ao invés dos dez a zero deste tempo, que tenhamos no mínimo um empate de DEZ a DEZ e que no futuro nós todos sejamos melhores do que as máquinas e não escravo delas como está ocorrendo hoje em dia.
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* Izaias Resplandes de Sousa, advogado e professor é o atual Presidente da União Poxorense de Escritores (UPE).